SENSACIONAL RESUMO DA DOUTRINA ESPÍRITA.
O Espiritismo em Sua Expressão Mais Simples
por Allan Kardec (1804-1869)
Prefácio
Em Janeiro de 1862, Allan Kardec publicou, na "Revista Espírita", o seguinte comentário sobre o livreto O Espiritismo em Sua Expressão Mais Simples, que acabava de editar:
"O objetivo desta publicação é dar, num quadro muito sucinto, o histórico do Espiritismo e uma ideia suficiente da Doutrina dos Espíritos, para que se lhe possa compreender o objetivo moral e filosófico. Pela clareza e pela simplicidade do estilo, procuramos pô-lo ao alcance de todas as inteligências. Contamos com o zelo de todos os verdadeiros Espíritas para ajudar a sua propagação.
- Allan Kardec"
Sumário
O Espiritismo em Sua Expressão Mais Simples...................................................................................3
Prefácio....................................................................................................................................... 4
Histórico do Espiritismo............................................................................................................. 5
Resumo do ensinamento dos Espíritos......................................................................................11
Máximas extraídas do ensinamento dos espíritos.....................................................................15
Histórico do Espiritismo.
Por volta de
1848, chamou-se a atenção, nos Estados Unidos, para diversos fenômenos
estranhos que consistiam em ruídos, batidas e movimento de objetos sem causa
conhecida. Esses fenômenos aconteciam com frequência, espontaneamente, com uma
intensidade e persistência singulares; mas notou-se também que ocorriam
particularmente sob a influência de certas pessoas, às quais se deu o nome de
médiuns, que podiam de certa forma provocá-los à vontade, o que permitiu
repetir as
experiências.
Para isso usaram-se, sobretudo mesas; não que este objeto seja mais favorável
que um outro, mas somente porque ele é móvel, é mais cômodo, e porque é mais
fácil e natural sentar-se em volta de uma mesa que de qualquer outro móvel.
Obteve-se dessa forma a rotação da mesa, depois movimentos em todos os
sentidos, saltos, reversões, flutuações, golpes dados com violência, etc. O fenômeno
foi designado, a princípio, com o nome de mesas girantes ou dança das mesas.
Até então, o
fenômeno podia explicar-se perfeitamente por uma corrente elétrica ou
magnética, ou pela ação de um fluído desconhecido, e esta foi, aliás, a primeira
opinião formada. Mas não se demorou a reconhecer, nesses fenômenos, efeitos
inteligentes; assim, o movimento obedecia à vontade; a mesa ia para a direita
ou para a esquerda, em direção a uma pessoa designada, ficava sobre um ou dois
pés sob comando; batia no chão o número de vezes pedido, batia regularmente, etc.
Ficou então
evidente que a causa não era puramente física e, a partir do axioma: Se todo
efeito tem uma causa, todo efeito inteligente deve ter uma causa inteligente,
concluiu-se que a causa desse fenômeno devia ser uma inteligência.
Qual era a
natureza dessa inteligência? Era essa a questão. A primeira ideia foi que podia
ser um reflexo da inteligência do médium ou dos assistentes, mas a experiência
demonstrou logo a impossibilidade disso, porque se obtiveram coisas completamente
fora do pensamento e dos conhecimentos das pessoas presentes, e até em
contradição com suas ideias, vontade e desejo; ela só podia, então, pertencer a
um ser invisível. O meio de certificar-se era bem simples: bastava iniciar uma
conversa com essa entidade, o que foi feito por meio de um número convencional
de batidas significando sim ou não, ou designando as letras do alfabeto; obtiveram-se,
dessa forma; respostas para as diversas questões que se lhe dirigiam. O
fenômeno foi designado pelo nome de mesas falantes. Todos os seres que se
comunicaram dessa forma, interrogados sobre sua natureza, declararam ser
Espíritos e pertencer ao mundo invisível. Como se tratava de efeitos produzidos
em um grande número de localidades, pela intervenção de pessoas diferentes, e
observados por homens muito sérios e esclarecidos, não era possível que fossem
um jogo de ilusão.
Da América
esse fenômeno passou para a França e o resto da Europa onde, por alguns anos,
as mesas girantes e falantes estiveram na moda e se tornaram o divertimento dos
salões; depois, quando as pessoas se cansaram, deixaram-nas de lado, em busca
de outra distração.
O fenômeno
não demorou a apresentar-se sob um novo aspecto que o fez sair do domínio da simples
curiosidade. Os limites deste resumo não nos permitem segui-lo em todas as suas
fases; assim passamos, sem transição, para o que ele oferece de mais característico,
para o que atraiu sobremaneira a atenção das pessoas sérias.
Salientemos,
antes, que a realidade do fenômeno encontrou numerosos opositores; alguns, sem
levar em conta a preocupação desinteressada e a honradez dos experimentadores,
só enxergaram uma fraude, uma hábil sutileza. Os que não admitem nada fora da
matéria, que só acreditam no mundo visível, que acham que tudo morre com o
corpo, os materialistas, em resumo os que se qualificam de espíritos fortes,
repeliram a existência dos Espíritos invisíveis para o campo das fábulas absurdas;
tacharam de loucos os que levavam a coisa a sério, e os cumularam de sarcasmos
e zombarias. Outros; não podendo negar os fatos, e sob o império de certas ideias,
atribuíram esses
fenômenos à
influência exclusiva do diabo e procuraram, assim, assustar os tímidos. Mas
hoje o medo do diabo perdeu singularmente seu prestígio; falaram tanto dele,
pintaram-no de tantos modos, que as pessoas se familiarizaram com essa ideia e
muitos acharam que era preciso aproveitar a ocasião para ver o que ele é
realmente.
Resultou
que, à parte de um pequeno número de mulheres timoratas, o anúncio da chegada
do verdadeiro diabo tinha algo de picante para aqueles que só o tinham visto em
quadros ou no teatro; ele foi para muita gente um poderoso estimulante, de modo
que os que quiseram levantar, por esse meio, uma barreira às novas ideias,
agiram contra seu próprio objetivo e tornaram-se, sem o querer, agentes
propagadores tanto mais eficazes quanto mais forte gritavam. Os outros críticos
não tiveram sucesso maior porque, aos fatos constatados, com raciocínios
categóricos, só puderam opor denegações. Leiam o que eles publicaram e em toda
parte encontrarão a prova da ignorância e a falta de observação séria dos
fatos; em nenhum lugar, uma demonstração peremptória de sua impossibilidade.
Toda a argumentação deles resume-se assim: "Eu não acredito, então não
existe; todos os que acreditam são loucos; somente nós temos o privilégio da
razão e do bom senso." O número dos adeptos feitos pela crítica séria ou
burlesca é incalculável, porque em todas elas só se encontram opiniões
pessoais, vazias de provas em contrário. Continuemos com nossa exposição.
As
comunicações por batidas eram lentas e incompletas; verificou-se que, adaptando
um lápis a um objeto móvel (cesto, prancheta ou um outro, sobre os quais se colocavam
os dedos), esse objeto começava a movimentar-se e traçava sinais. Mais tarde
verificou-se que esses objetos eram tão somente acessórios que podiam ser
dispensados; a experiência demonstrou que o Espírito, que agia sobre um corpo
inerte dirigindo-o à vontade, podia agir da mesma forma sobre o braço ou a mão,
conduzindo o lápis. Tivemos então médiuns escritores, ou seja, pessoas que
escreviam de modo involuntário, sob o impulso dos Espíritos, de que eram
instrumentos e intérpretes. A partir daí, as
comunicações
não tiveram mais limites, e a troca de pensamentos pode-se fazer com tanta
rapidez e desenvolvimento quanto entre os vivos. Era um vasto campo aberto à
exploração, a descoberta de um mundo novo: o mundo dos invisíveis, assim como o
microscópio tinha desvendado o mundo dos infinitamente pequenos.
Que são
esses Espíritos? Que papel desempenham no Universo? Com que propósito se
comunicam com os mortais? Tais eram as primeiras questões que se impunham resolver.
Soube-se logo, por eles mesmos, que não se trata de seres à parte na criação,
mas das próprias almas daqueles que viveram na Terra ou em outros mundos; que
essas almas, depois de terem despojado de seu envoltório corporal, povoam e
percorrem o espaço. Não houve mais possibilidade de dúvidas quando se reconheceram,
entre eles, parentes e amigos, com quem se pôde conversar; quando estes vieram
dar prova de sua existência, demonstrar que a morte para eles foi só do corpo,
que sua alma ou Espírito continua a viver que estão ali junto de nós, vendo-nos
e observando-nos como quando eram vivos, cercando de solicitude aqueles que
amaram, e cuja lembrança é para eles uma doce satisfação.
Geralmente
fazemos dos Espíritos uma ideia completamente falsa; eles não são como muitos imaginam
seres abstratos, vagos e indefinidos, nem algo como um clarão ou uma centelha;
são, ao contrário, seres muito reais, com sua individualidade e uma forma
determinada. Podemos ter uma ideia aproximada pela explicação seguinte:
Há no homem
três coisas essenciais:
l) a Alma ou Espírito, princípio inteligente
em que residem o pensamento, a vontade e o senso moral;
2) o corpo,
envoltório material, pesado e grosseiro, que coloca o Espírito em relação com o
mundo exterior;
3) o
perispírito, envoltório fluídico, leve, que serve de laço e intermediário entre
o Espírito e o corpo. Quando o envoltório exterior está gasto e não pode mais
funcionar, ele cai e o Espírito despoja-se dele como o fruto de sua casca, a
árvore de sua crosta; em resumo, como se abandona uma roupa velha que não serve
mais; é a isso que chamamos morte.
A morte,
portanto, não passa da destruição do grosseiro envoltório do Espírito - só o
corpo morre, o Espírito não. Durante a vida o Espírito está de certa forma
limitado pelos laços da matéria a que está unido e que, muitas vezes, paralisa
suas faculdades; a morte do corpo desembaraça-o de seus laços; ele se liberta e
recupera sua liberdade, como a borboleta saindo de sua crisálida. Mas ele só abandona
o corpo material; conserva o perispírito, que constitui para ele uma espécie de
corpo etéreo, vaporoso, imponderável para nós e de forma humana, que parece ser
a forma-tipo. Em seu estado normal, o perispírito é invisível, mas o Espírito
pode fazer com que sofra certas modificações que o tornam momentaneamente
acessíveis à vista e até ao contato, como acontece com o vapor condensado; é
assim que eles podem às vezes mostrar-se a nós em aparições. É com a ajuda do perispírito
que o Espírito age sobre a matéria inerte e produz os diversos fenômenos de
ruído, de movimento, de escrita, etc.
As batidas e
movimentos são, para os Espíritos, meios de atestar sua presença e chamar para
si a atenção, exatamente como quando uma pessoa bate para avisar que há alguém.
Há os que não se limitam a ruídos moderados, mas que chegam a fazer um alarido
como de louça quebrando, de portas que se abrem e se fecham, ou de móveis
derrubados.
Através de
batidas e movimentos combinados eles puderam exprimir seus pensamentos, mas a escrita
lhes oferece o meio completo, mais rápido e mais cômodo; é o que eles preferem.
Pela mesma razão que podem formar caracteres, podem guiar a mão para traçar
desenhos, escrever música, executar uma peça em um instrumento, em resumo, na
falta do próprio corpo, que não têm mais, usam o do médium para manifestar-se
aos homens de uma maneira sensível.
Os Espíritos
podem ainda manifestar-se de várias maneiras, entre outras pela visão e pela
audição.
Certas
pessoas, ditas médiuns auditivos, têm a faculdade de ouvi-los e podem, assim,
conversar com eles; outras os veem - são os médiuns videntes. Os Espíritos que
se manifestam à visão apresentam-se geralmente sob forma análoga à que tinham
quando vivos, porém vaporosa; outras vezes, essa forma tem toda a aparência de
um ser vivo, a ponto de iludir completamente, tanto que algumas vezes foram
tomados por criaturas de carne e osso, com as quais se pôde conversar e trocar
apertos de mãos, sem se suspeitar que se tratava de Espíritos, a não ser em
razão de seu desaparecimento súbito.
A visão
permanente e geral dos Espíritos é bem rara, mas as aparições individuais são
bastante frequentes, sobretudo no momento da morte; o Espírito liberto parece
ter pressa de rever seus parentes e amigos, como para avisá-los que acaba de
deixar a terra e dizer-lhes que continua vivendo.
Que cada um
junte suas lembranças, e veremos quantos fatos autênticos desse tipo, de que
não nos apercebíamos, aconteceram não só à noite, durante o sono, mas em pleno
dia e no estado mais completo de vigília. Outrora víamos esses fatos como sobrenaturais
e maravilhosos, e os atribuíamos à magia e à feitiçaria; hoje, os incrédulos os
atribuem à imaginação; mas desde que a ciência espírita nos deu a chave,
sabemos como se produzem e que não saem da ordem dos fenômenos naturais.
Acreditamos
ainda que os Espíritos, só pelo fato de serem Espíritos, devem ser donos da
soberana ciência e da soberana sabedoria: é um erro que a experiência não
tardou a demonstrar. Entre as comunicações feitas pelos Espíritos, algumas são
sublimes de profundidade, eloquência, sabedoria, moral, e só respiram bondade e
benevolência; mas, ao lado dessas, há aquelas muito vulgares, fúteis, triviais,
grosseiras até, pelas quais o Espírito revela os mais perversos instintos. Fica
então evidente que elas não podem emanar da mesma fonte e que, se há bons
Espíritos, há, também, maus.
Os
Espíritos, não sendo mais que as almas dos homens, naturalmente não podem
tornar-se perfeitos ao abandonar seu corpo; até que tenham progredido,
conservam as imperfeições da vida corpórea; é por isso que os vemos em todos os
graus de bondade e maldade, de saber e ignorância.
Os Espíritos
geralmente se comunicam com prazer, constituindo para eles uma satisfação ver
que não foram esquecidos; descrevem de boa vontade suas impressões ao deixar a
Terra, sua nova situação, a natureza de suas alegrias e sofrimentos no mundo em
que se encontram. Uns são muito felizes, outros infelizes, alguns até sofrem
horríveis tormentos, segundo a maneira como viveram e o emprego bom ou mau,
útil ou inútil que fizeram da vida. Observando-os em todas as fases de sua nova
existência, de acordo com a posição que ocuparam na terra, seu tipo de morte,
seu caráter e seus hábitos como homens, chegamos a um conhecimento senão
completo, pelo menos bastante
preciso do
mundo invisível, para termos a explicação do nosso estado futuro e pressentir o
destino feliz ou infeliz que lá nos espera.
As
instruções dadas pelos Espíritos de categoria elevada sobre todos os assuntos
que interessam à humanidade, as respostas que eles deram às questões que lhes
foram propostas, foram recolhidas e coordenadas com cuidado, constituindo toda
uma ciência, toda uma doutrina moral e filosófica, sob o nome de Espiritismo. O
Espiritismo é, pois, a doutrina fundada na existência, nas manifestações e no
ensinamento dos Espíritos. Esta doutrina acha-se exposta de modo completo em O
Livro dos Espíritos, quanto à sua parte filosófica; em O Livro dos Médiuns,
quanto à parte prática e experimental; e em O Evangelho segundo o Espiritismo,
quanto à parte moral. Podemos avaliar, pela análise que faremos abaixo dessas
obras, a variedade, a extensão e a importância dos assuntos que a doutrina
envolve.
Como vimos,
o Espiritismo teve seu ponto de partida no fenômeno vulgar das mesas girantes;
mas como esses fatos falam mais aos olhos que à inteligência, despertam mais
curiosidade que sentimento, satisfeita a curiosidade, fica-se menos
interessado, na medida de nossa falta de compreensão. A situação mudou quando a
teoria veio explicar a causa; sobretudo quando se viu que dessas mesas girantes
com as quais as pessoas se divertiram algum tempo, saia toda uma doutrina moral
que fala à alma, dissipando as angústias da dúvida, satisfazendo a todas as aspirações
deixadas no vácuo por um ensinamento incompleto sobre o futuro da humanidade,
as pessoas sérias acolheram a nova doutrina como um benefício e, a partir de
então, longe de declinar, ela cresceu com incrível rapidez. No espaço de alguns
anos conseguiu adesões em todos os países do mundo, sobretudo entre as pessoas
esclarecidas, inúmeros partidários que aumentam todos os dias em uma proporção
extraordinária, de tal forma que hoje se pode dizer que o Espiritismo
conquistou direito de cidadania. Ele está assentado em bases que desafiam os
esforços de seus adversários mais ou menos interessados em combatê-lo e a prova
é que os ataques e críticas não retardaram sua marcha um só instante - este é
um fato obtido da experiência, cujo motivo os oponentes nunca puderam explicar;
os espíritas dizem simplesmente que, se ele se propaga apesar da crítica, é que
o acham bom e que se prefere seu modo de raciocinar ao de seus contestadores.
O
Espiritismo, entretanto, não é uma descoberta moderna; os fatos e princípios
sobre os quais ele repousa perdem-se na noite dos tempos, pois encontramos seus
vestígios nas crenças de todos os povos, em todas as religiões, na maior parte
dos escritores sagrados e profanos; só que os fatos, não completamente
observados, foram muitas vezes interpretados segundo as ideias supersticiosas
da ignorância, e não foram deduzidas todas as suas consequências.
Com efeito,
o Espiritismo está fundado sobre a existência dos Espíritos, mas os Espíritos
não sendo mais que as almas dos homens, desde que há homens, há Espíritos; o
Espiritismo nem os descobriu, nem os inventou. Se as almas ou Espíritos podem
manifestar-se aos vivos, é que isso é natural e, portanto, eles devem tê-lo
feito todo o tempo; assim, em qualquer época e qualquer lugar encontramos a
prova dessas manifestações abundantes, sobretudo nos relatos bíblicos.
O que é
moderno é a explicação lógica dos fatos, o conhecimento mais completo da
natureza dos Espíritos, de seu papel e seu modo de ação, a revelação de nosso
estado futuro, enfim, sua constituição em corpo de ciência e de doutrina e suas
diversas aplicações. Os Antigos conheciam o princípio, os Modernos conhecem os
detalhes. Na Antiguidade, o estudo desses fenômenos constituía o privilégio de
certas castas que só os revelavam aos iniciados em seus mistérios; na Idade
Média, os que se ocupavam ostensivamente com isso eram tidos como feiticeiros
e, por isso, queimados; mas hoje não há mistérios para ninguém, não se queima
mais ninguém; tudo se passa claramente e todo mundo pode esclarecer-se e
praticá-lo, pois há médiuns em toda parte.
A própria
doutrina que os espíritos ensinam hoje não tem nada de novo; é encontrada em fragmentos
na maior parte dos filósofos da Índia, do Egito e da Grécia, e inteira no
ensinamento de Cristo. Então o que vem fazer o Espiritismo? Vem confirmar novos
testemunhos, demonstrar, por fatos, verdades desconhecidas ou mal
compreendidas, restabelecer em seu verdadeiro sentido as que foram mal
interpretadas.
O
Espiritismo não ensina nada de novo, é verdade; mas não é nada provar de modo
patente, irrecusável, a existência da alma, sua sobrevivência ao corpo, sua individualidade
depois da morte, sua imortalidade, as penas e recompensas futuras? Quanta gente
acredita nessas coisas, mas acredita com um vago pensamento dissimulado de
incerteza, e diz em seu foro íntimo: "E se não fosse assim?" Quantos
não foram levados à incredulidade porque lhes apresentaram o futuro sob um aspecto
que sua razão não podia admitir? Então, não é nada que o crente vacilante possa
dizer:
"Agora
tenho certeza!", que o cego reveja a luz? Pelos fatos e por sua lógica, o
Espiritismo vem dissipar a ansiedade da dúvida e trazer de volta à fé aquele
que dela se afastou; revelando-nos a existência do mundo invisível que nos
rodeia, e no meio do qual vivemos sem suspeitar, ele nos dá a conhecer, pelo
exemplo dos que viveram, as condições de nossa felicidade ou infelicidade
futura; ele nos explica a causa de nossos sofrimentos aqui na terra e o meio de
amenizá-los. Sua propagação terá por efeito inevitável a destruição das
doutrinas materialistas, que não podem resistir à evidência. O homem,
convencido da grandeza e da importância de sua existência futura, que é eterna,
compara-a com a incerteza da vida terrestre, que é tão curta, e eleva-se, pelo
pensamento, acima das mesquinhas considerações humanas; conhecendo a causa e o
propósito de suas misérias, ele as suporta com paciência e resignação, porque
sabe que elas são um meio de chegar a um estado melhor. O exemplo daqueles que
vêm do além-túmulo descrever suas alegrias e dores, provando a realidade da
vida futura, prova ao mesmo tempo que a justiça de Deus não deixa nenhum vício
sem punição e nenhuma virtude sem recompensa. Acrescentemos, finalmente, que as
comunicações com os seres queridos que perdemos acarretam uma doce consolação,
provando não só que eles existem, mas que estamos menos separados deles que se
estivessem vivos num país estrangeiro.
Em resumo, o
Espiritismo suaviza a amargura das tristezas da vida; acalma os desesperos e as
agitações da alma, dissipa as incertezas ou os terrores do futuro, elimina o
pensamento de abreviar a vida pelo suicídio; da mesma forma torna felizes os
que aderem a ele, e está aí o grande segredo de sua rápida propagação.
Do ponto de
vista religioso, o Espiritismo tem por base as verdades fundamentais de todas
as religiões: Deus, a alma, a imortalidade, as penas e as recompensas futuras;
mas é independente de qualquer culto particular. Seu propósito é provar, aos
que negam ou duvidam que a alma existe, que ela sobrevive ao corpo, que ela
sofre depois da morte as consequências ao bem e do mal que fez durante a vida
corpórea; ora, isto é de todas as religiões.
Como crença
nos espíritos, também não se afasta de qualquer religião, ou de qualquer povo,
porque em todo lugar onde há homens há almas ou espíritos; que as manifestações
são de todos os tempos, e o relato delas acha-se em todas as religiões, sem
exceção. Pode-se, portanto, ser católico, grego ou romano, protestante, judeu
ou muçulmano, e acreditar nas manifestações dos espíritos, e consequentemente
ser Espírita; a prova é que o Espiritismo tem aderentes em todas as seitas.
Como moral,
ele é essencialmente cristão, porque a doutrina que ensina é tão-somente o desenvolvimento
e a aplicação da do Cristo, a mais pura de todas, cuja superioridade não é contestada
por ninguém, prova evidente de que é a lei de Deus; ora, a moral está a serviço
de todo mundo.
O
Espiritismo, sendo independente de qualquer forma de culto, não prescrevendo
nenhum deles, não se ocupando de dogmas particulares, não é uma religião
especial, pois não tem nem seus padres nem seus templos. Aos que indagam se
fazem bem em seguir esta ou aquela prática, ele responde:
Se sua
consciência pede para fazê-lo, faça-o; Deus sempre leva em conta a intenção. Em
resumo, ele não se impõe a ninguém; não se destina àqueles que têm fé ou àqueles
a quem essa fé basta, mas à numerosa categoria dos inseguros e dos incrédulos;
ele não os tira da Igreja, visto que eles se separaram dela moralmente em tudo,
ou em parte; ele os faz percorrer os três quartos do caminho para entrar nela;
cabe a ela fazer o resto.
O
Espiritismo combate é verdade, certas crenças como a eternidade das penas, o
fogo material do inferno, a personalidade do diabo, etc.; mas não é certo que
essas crenças, impostas como absolutas, sempre fizeram incrédulos e continuam a
fazê-los? Se o Espiritismo, dando desses dogmas e de alguns outros uma
interpretação racional, devolve à fé aqueles que dela desertaram não está prestando
serviço à religião? Assim, um venerável eclesiástico dizia a esse respeito:
"O Espiritismo faz acreditar em alguma coisa; ora, é melhor acreditar em
alguma coisa que não acreditar em absolutamente nada." Os Espíritos não
sendo senão almas, não se pode negar os Espíritos sem negar a alma. Sendo
admitidas as
almas ou Espíritos, a questão reduzida à sua mais simples expressão é esta: As
almas dos que morreram podem comunicar-se com os vivos? O Espiritismo prova a
afirmativa pelos fatos materiais; que prova se pode dar de que isso não é
possível? Se assim é, todas as negações do mundo não impedirão que assim seja,
pois não se trata nem de um sistema, nem de uma teoria, mas de uma lei da
natureza; ora, contra as leis da natureza, a vontade do homem é impotente; é
preciso, querendo ou não, aceitar suas consequências, e adequar suas crenças e
seus hábitos.
Resumo do ensinamento dos Espíritos.
1. Deus é a
inteligência suprema, causa primeira de todas as coisas.
Deus é
eterno, único, imaterial, imutável, Todo-Poderoso, soberanamente justo e bom.
Deve ser infinito em todas as suas perfeições, pois se supuséssemos um único de
seus atributos imperfeito, ele não seria mais Deus.
2. Deus
criou a matéria que constitui os mundos; também criou seres inteligentes que
chamamos de Espíritos, encarregados de administrar os mundos materiais segundo as
leis imutáveis da criação, e que são perfectíveis por sua natureza.
Aperfeiçoando-se, eles se aproximam da Divindade.
3. O
espírito propriamente dito é o princípio inteligente; sua natureza íntima nos é
desconhecida; para nós ele é imaterial, porque não tem nenhuma analogia com o
que chamamos matéria.
4. Os
Espíritos são seres individuais; têm um envoltório etéreo, imponderável,
chamado períspirito, espécie de corpo fluídico, semelhante à forma humana.
Povoam os espaços, que percorrem com a rapidez do raio, e constituem o mundo
invisível.
5. A origem
e o modo de criação dos Espíritos nos são desconhecidos; só sabemos que são
criados simples e ignorantes, quer dizer, sem ciência e sem conhecimento do bem
e do mal, mas com igual aptidão para tudo, pois Deus, em sua justiça, não podia
isentar uns do trabalho que teria imposto aos outros para chegar à perfeição.
No princípio, ficam em uma espécie de infância, sem vontade própria e sem
consciência perfeita de sua existência.
6.
Desenvolvendo-se o livre arbítrio nos Espíritos ao mesmo tempo que as ideias,
Deus lhes diz:
"Vocês
podem aspirar à felicidade suprema, assim que tiverem adquirido os
conhecimentos que lhes faltam e cumprido a tarefa que lhes imponho. Então
trabalhem para seu engrandecimento; este é o objetivo; irão atingi-lo seguindo
as leis que gravei em sua consciência."
Em consequência
de seu livre arbítrio, uns tomam o caminho mais curto, que é o do bem, outros o
mais longo, que é o do mal.
7. Deus não
criou o mal; estabeleceu leis, e essas leis são sempre boas, porque ele é
soberanamente bom; aquele que as observasse fielmente seria perfeitamente
feliz; mas os Espíritos, tendo seu livre arbítrio, nem sempre as observaram, e
o mal veio de sua desobediência. Pode-se então dizer que o bem é tudo o que é
conforme a lei de Deus e o mal tudo o que é contrário a essa mesma lei.
8. Para
cooperar, como agentes do poder divino, com a obra dos mundos materiais, os Espíritos
revestem-se temporariamente de um corpo material. Pelo trabalho de que sua
existência corpórea necessita, eles aperfeiçoam sua inteligência e adquirem,
observando a lei de Deus, os méritos que devem conduzi-los à felicidade eterna.
9. A
encarnação não foi imposta ao Espírito, no princípio, como uma punição; ela é
necessária ao seu desenvolvimento e para a realização das obras de Deus, e
todos devem resignar-se a ela, tomem o caminho do bem ou do mal; só que os que
seguem o caminho do bem, avançando mais rapidamente, demoram menos a chegar ao
fim e lá chegam em condições menos penosas.
10. Os
Espíritos encarnados constituem a humanidade, que não está circunscrita à
Terra, mas que povoa todos os mundos disseminados pelo espaço.
11. A alma
do homem é um Espírito encarnado. Para auxiliá-lo no cumprimento de sua tarefa;
Deus lhe deu, como auxiliares, os animais; que lhe são submissos e cuja
inteligência e caráter são proporcionais às suas necessidades.
12. O
aperfeiçoamento do Espírito é o fruto de seu próprio trabalho; não podendo, em
uma única existência corpórea, adquirir todas as qualidades morais e
intelectuais que devem conduzi-lo ao objetivo, ele aí chega por uma sucessão de
existências, dando em cada uma delas alguns passos adiante no caminho do
progresso.
13. Em cada
existência corpórea o Espírito deve cumprir uma missão proporcional a seu desenvolvimento;
quanto mais ela for rude e laboriosa, maior seu mérito em cumpri-la. Cada existência
é, assim, uma prova que o aproxima do alvo. O número de suas existências é indeterminado.
Depende da vontade do Espírito de abreviá-las, trabalhando ativamente em seu aperfeiçoamento
moral; assim como depende da vontade do operário que tem de realizar um trabalho
abreviar o número de dias para sua execução.
14. Quando
uma existência foi mal empregada, não aproveitou o Espírito, que deve
recomeçá-la em condições mais ou menos penosas, em razão de sua negligência e
de sua má vontade; assim é que, na vida, podemos ser obrigados a fazer no dia
seguinte o que não fizemos no anterior, ou a refazer o que fizemos mal.
15. A vida
espiritual é a vida normal do Espírito: ela é eterna; a vida corpórea é
transitória e passageira: é apenas um instante na eternidade.
16. No
intervalo de suas existências corpóreas, o Espírito é errante. Não por duração
determinada; nesse estado o espírito é feliz ou infeliz de acordo com o bom ou
mau emprego de sua última existência; ele estuda as causas que apressaram ou
retardaram seu desenvolvimento; toma resoluções que tentará pôr em prática na
próxima encarnação e escolhe, ele mesmo, as provas que considera mais adequadas
ao seu progresso; mas algumas vezes ele se engana, ou sucumbe não mantendo como
homem as resoluções que tomou como Espírito.
17. O
Espírito culpado é punido pelos sofrimentos morais no mundo dos Espíritos, e
pelas penas físicas na vida corpórea. Suas aflições são consequências de suas
faltas, quer dizer, de sua infração à lei de Deus; de modo que constituem
simultaneamente uma expiação do passado e uma prova para o futuro é assim que o
orgulhoso pode ter uma existência de humilhação, o tirano uma vida de servidão;
o rico mau uma encarnação de miséria.
18. Há
mundos apropriados aos diferentes graus de avanço dos Espíritos, onde a
existência corpórea acha-se em condições muito diferentes. Quanto menos o
Espírito é adiantado, mais os corpos de que se reveste são pesados e materiais;
à medida que se purifica, passa para mundos superiores moral e fisicamente. A
Terra não é o primeiro nem o último, mas um dos mundos mais atrasados.
19. Os
Espíritos culpados são encarnados em mundos menos adiantados, onde expiam suas
faltas pelas tribulações da vida material. Esses mundos são para eles
verdadeiros purgatórios, dos quais depende deles sair, trabalhando em seu
progresso moral. A Terra é um desses mundos.
20. Deus,
sendo soberanamente justo e bom, não condena suas criaturas a castigos
perpétuos pelas faltas temporárias; oferece-lhes em qualquer ocasião meios de
progredir e reparar a mal que elas praticaram. Deus perdoa, mas exige o
arrependimento, a reparação e o retorno ao bem, de modo que a duração do
castigo é proporcional à persistência do Espírito no mal; consequentemente, o
castigo seria eterno para aquele que permanecesse eternamente no mau caminho,
mas, assim que um sinal de arrependimento entra no coração do culpado, Deus
estende sobre ele sua misericórdia. A eternidade das penas deve assim ser
entendida no sentido relativo, e não no sentido absoluto.
21. Os
Espíritos, encarnando-se, trazem com eles o que adquiriram em suas existências
precedentes; é a razão por que os homens mostram instintivamente aptidões
especiais; inclinações boas ou más que lhes parecem inatas.
As más
inclinações naturais são os vestígios das imperfeições do Espírito, dos quais
ele não se despojou inteiramente; são também os indícios das faltas que ele
cometeu, e o verdadeiro pecado original. A cada existência ele deve lavar-se de
algumas impurezas.
22. O
esquecimento das existências anteriores é uma graça de Deus que, em sua
bondade, quis poupar ao homem lembranças frequentemente penosas. Em cada nova existência,
o homem é o que ele fez de si mesmo; é para ele um novo ponto de partida - ele
conhece seus defeitos atuais, sabe que esses defeitos são a consequência dos
que tinha, tira conclusões do mal que pôde ter cometido, e isso lhe basta para
trabalhar, corrigindo-se. Se tinha outrora defeitos que não tem mais, não tem mais
que preocupar-se com eles; bastam-lhe as imperfeições presentes.
23. Se a
alma ainda não existiu, é que foi criada ao mesmo tempo que o corpo; nessa
suposição, ela não pode ter nenhuma relação com as que a precederam.
Pergunta-se, então, como Deus, que é soberanamente justo e bom, pode tê-la
feito responsável pelo erro do pai do gênero humano, maculando-a com um pecado
original que ela não cometeu. Dizendo, ao contrário, que ela traz ao renascer o
germe das imperfeições de suas existências anteriores, que ela sofre na
existência atual as consequências de suas faltas passadas, dá-se do pecado
original uma explicação lógica que todos podem compreender e admitir, porque a
alma só é responsável por suas próprias obras.
24. A
diversidade das aptidões inatas, morais e intelectuais, é a prova de que a alma
já viveu; se tivesse sido criada ao mesmo tempo que o corpo atual, não estaria
de acordo com a bondade de Deus ter feito umas mais avançadas que as outras.
Por que selvagens e homens civilizados, bons e maus; tolos e brilhantes?
Dizendo-se que uns viveram mais que os outros e mais adquiriram, tudo se explica.
25. Se a
existência atual fosse única e devesse decidir sozinha sobre o futuro da alma
para a eternidade, qual seria o destino das crianças que morrem em tenra idade?
Não tendo feito nem bem nem mal, elas não merecem nem recompensas nem punições.
Segundo a palavra do Cristo, sendo cada um recompensado segundo suas obras,
elas não têm direito à felicidade perfeita dos anjos, nem merecem ser dela
privadas. Diga-se que poderão, em uma outra existência, realizar o que não puderam
naquela que foi abreviada, e não há mais exceções.
26. Pelo
mesmo motivo, qual seria a sorte dos cretinos, idiotas? Não tendo nenhuma
consciência do bem e do mal, não têm nenhuma responsabilidade por seus atos.
Deus seria justo e bom tendo criado almas estúpidas para destiná-las a uma
existência miserável e sem compensações? Admita-se, pelo contrário, que a alma
do idiota e do cretino é um Espírito em punição dentro de um corpo impróprio
para exprimir seu pensamento, onde ele é como um homem fortemente aprisionado
por laços, e não se terá mais nada que não seja conforme com a justiça de Deus.
27. Em suas
encarnações sucessivas, o Espírito, sendo pouco a pouco despojado de suas
impurezas e aperfeiçoado pelo trabalho, chega ao termo de suas existências
corpóreas; pertence então à ordem dos Espíritos puros ou dos anjos, e goza
simultaneamente da vida completa de Deus e de uma felicidade imperturbável pela
eternidade.
28. Estando
os homens em expiação na terra, Deus, como bom pai, não os entregou a si mesmos
sem guias. Eles têm primeiro seus Espíritos protetores ou anjos guardiães, que
velam por eles e se esforçam para conduzi-los ao bom caminho; têm ainda os
Espíritos em missão na terra, Espíritos superiores encarnados de quando em
quando entre eles para lhes iluminar o caminho através de seus trabalhos e
fazer a humanidade avançar. Se bem que Deus tenha gravado sua lei na
consciência, ele achou que devia formulá-la de maneira explícita; mandou
primeiro Moisés, mas as leis de Moisés estavam ajustadas aos homens de seu
tempo; ele só lhes falou da vida terrestre, de penas e de recompensas
temporais. O Cristo veio depois completar a lei de Moisés através de um
ensinamento mais elevado: a pluralidade das existências, a vida espiritual, mas
as penas e as recompensas morais.
Moisés os
conduziu pelo medo, o Cristo pelo amor e pela caridade.
29. O
Espiritismo, mais bem entendido hoje, acrescenta para os incrédulos a evidência
à teoria; prova o futuro com fatos patentes; diz em termos claros e sem
equívoco o que o Cristo disse em parábolas; explica as verdades desconhecidas
ou falsamente interpretadas; revela a existência do mundo invisível ou dos
Espíritos, e inicia o homem nos mistérios da vida futura; vem combater o materialismo,
que é uma revolta contra o poder de Deus; vem enfim estabelecer entre os homens
o reino da caridade e da solidariedade anunciado pelo Cristo. Moisés lavrou, o
Cristo semeou, o Espiritismo vem colher.
30. O
Espiritismo não é uma luz nova, mas uma luz mais brilhante, porque surgiu de
todos os pontos do globo através daqueles que viveram. Tornando evidente o que
era obscuro, põe fim às interpretações errôneas, e deve unir os homens em uma
mesma crença, porque não há senão um Deus, e suas leis são as mesmas para
todos; ele marca enfim a era dos tempos preditos pelo Cristo e pelos profetas.
31. Os males
que afligem os homens na terra têm como causa o orgulho, o egoísmo e todas as
más paixões. Pelo contato de seus vícios, os homens tornam-se reciprocamente
infelizes e punem-se uns aos outros. Que a caridade e a humildade substituam o
egoísmo e o orgulho, então eles não quererão mais prejudicar-se; respeitarão os
direitos de cada um e farão reinar entre eles a concórdia e a justiça.
32. Mas como
destruir o egoísmo e o orgulho, que parecem inatos no coração do homem? – O egoísmo
e o orgulho estão no coração do homem, porque os homens são espíritos que
seguiram desde o princípio o caminho do mal, e que foram exilados na terra como
punição desses mesmos vícios; é o seu pecado original, de que muitos não se
despojaram. Através do Espiritismo, Deus vem fazer um último apelo para a
prática da lei ensinada pelo Cristo: a lei de amor e de caridade.
33. Tendo a
terra chegado ao tempo marcado para tornar-se uma morada de felicidade e de
paz, Deus não quer que os maus Espíritos encarnados continuem a trazer para ela
a perturbação, em prejuízo dos bons; é por isso que eles deverão deixá-la: Irão
expiar seu empedernimento em mundos menos evoluídos; onde trabalharão de novo
para seu aperfeiçoamento em uma série de existências mais infelizes e mais
penosas ainda que na terra.
Eles
formarão nesses mundos uma nova raça mais esclarecida, cuja tarefa será levar o
progresso aos seres atrasados que neles habitam, pelos conhecimentos que já
adquiriram. Só sairão para um mundo melhor quando tiverem merecido, e assim por
diante, até que tenham atingido a purificação completa: Se a terra era para
eles um purgatório, esses mundos serão seu inferno, mas um inferno de onde a
esperança nunca está banida.
34. Enquanto
a geração proscrita vai desaparecer rapidamente; surge uma nova geração, cujas crenças
serão fundadas no Espiritismo cristão. Nós assistimos à transição que se opera,
prelúdio da renovação moral cuja chegada o Espiritismo marca.
Máximas extraídas do ensinamento dos
espíritos.
35. O
objetivo essencial do Espiritismo é o melhoramento dos homens. Não é preciso
procurar nele senão o que pode ajudá-lo para o progresso moral e intelectual.
36. O
verdadeiro Espírita não é o que crê nas manifestações, mas aquele que faz bom
proveito do ensinamento dado pelos Espíritos. Nada adianta acreditar se a
crença não faz com que se dê um passo adiante no caminho do progresso e que não
o faça melhor para com o próximo.
37. O egoísmo,
o orgulho, a vaidade, a ambição, a cupidez, o ódio, a inveja, o ciúme, a maledicência
são para a alma ervas venenosas das quais é preciso a cada dia arrancar algumas
hastes, e que têm como contraveneno: a caridade e a humildade.
38. A crença
no Espiritismo só é proveitosa para aquele de quem se pode dizer: hoje está
melhor do que ontem.
39. A
importância que o homem atribui aos bens temporais está na razão inversa de sua
fé na vida espiritual; é a dúvida sobre o futuro que o leva a procurar suas alegrias
neste mundo, satisfazendo suas paixões, ainda que às custas do próximo.
40. As
aflições na terra são os remédios da alma; elas salvam para o futuro, como uma
operação cirúrgica dolorosa salva a vida de um doente e lhe devolve a saúde. É
por isso que o Cristo disse:
"Bem-aventurados
os aflitos, pois eles serão consolados."
41. Nas suas
aflições, olhe abaixo de você e não acima; pense naqueles que sofrem ainda mais
que você.
42. O
desespero é natural para aquele que crê que tudo acaba com a vida do corpo; é
um contrassenso para aquele que tem fé no futuro.
43. O homem
é muitas vezes o artesão de sua própria infelicidade neste mundo; se ele voltar
à fonte de seus infortúnios, verá que a maior parte deles é o resultado de sua
imprevidência, de seu orgulho e avidez, consequentemente, de sua infração às
leis de Deus.
44. A prece
é um ato de adoração. Orar a Deus é pensar Nele; é aproximar-se Dele; é pôr-se
em comunicação com Ele.
45. Aquele
que ora com fervor e confiança é mais forte contra as tentações do mal, e Deus
envia-lhe bons Espíritos para assisti-lo. É um auxílio que nunca é recusado,
quando é pedido com sinceridade.
46. O
essencial não é orar muito, mas orar bem. Certas pessoas creem que todo o
mérito está na extensão da prece, enquanto fecham os olhos para seus próprios
defeitos. A prece é para eles uma ocupação, um emprego do tempo, mas não uma
análise de si mesmos.
47. Aquele
que pede a Deus o perdão de seus erros não o obtém senão mudando de conduta. As
boas ações são a melhor das preces, pois os atos valem mais que as palavras.
48. A prece
é recomendada por todos os bons Espíritos; é, além disso, pedida por todos os
Espíritas imperfeitos como um meio de tornar mais leves seus sofrimentos.
49. A prece
não pode mudar os desígnios da Providência; mas, vendo que há interesse por
eles, os Espíritos sofredores se sentem menos desamparados; tornam-se menos
infelizes; ela exalta sua coragem, estimula neles o desejo de elevar-se pelo
arrependimento e reparação, e pode desviá-los do pensamento do mal. É nesse
sentido que ela pode não só aliviar, mas abreviar seus sofrimentos.
50. Cada um
ore segundo suas convicções e o modo que acredita mais conveniente, pois a
forma não é nada, o pensamento é tudo; a sinceridade e a pureza de intenção é o
essencial; um bom pensamento vale mais que numerosas palavras, que se
assemelham ao barulho de um moinho e onde o coração não está.
51. Deus fez
homens fortes e poderosos para que fossem sustentáculos dos fracos; o forte que
oprime o fraco é advertido por Deus; em geral ele recebe o castigo nesta vida,
sem prejuízo do futuro.
52. A
fortuna é um depósito cujo possuidor é tão-somente o usufrutuário, já que não a
leva com ele para o túmulo; ele prestará rigorosas contas do emprego que fez
dela.
53. A
fortuna é uma prova mais arriscada que a miséria, porque é uma tentação para o
abuso e os excessos, e porque é mais difícil ser moderado que ser resignado.
54. O
ambicioso que triunfa e o rico que se sustenta de prazeres materiais são mais
de se lamentar que de se invejar, pois é preciso ter em conta o retorno. O
Espiritismo, pelos terríveis exemplos dos que viveram e que vêm revelar sua
sorte, mostra a verdade desta afirmação do Cristo: "Aquele que se orgulha
será humilhado e aquele que se humilha será elevado."
55. A caridade
é a lei suprema do Cristo: "Amem-se uns aos outros como irmãos; - ame seu próximo
como a si mesmo; perdoe seus inimigos; - não faça a outrem o que não gostaria
que lhe fizessem"; tudo isso se resume na palavra caridade.
56. A
caridade não está só na esmola, pois há a caridade em pensamentos, em palavras
e em ações. Aquele caridoso em pensamentos, é indulgente para com as faltas do
próximo; caridoso em palavras, não diz nada que possa prejudicar seu próximo;
caridoso em ações assiste seu próximo na medida de suas forças.
57. O pobre
que divide seu pedaço de pão com um mais pobre que ele é mais caridoso e tem
mais mérito aos olhos de Deus que o que dá o que lhe é supérfluo, sem se privar
de nada.
58. Aquele
que nutre contra seus próximos sentimentos de animosidade, ódio, ciúme e
rancor, falta à caridade; ele mente, se se diz cristão, e ofende a Deus.
59. Homens
de todas as castas, de todas as seitas e de todas as cores, vocês são todos
irmãos, pois Deus os chama a todos para ele; estendam-se, pois as mãos,
qualquer que seja sua maneira de adorá-lo, e não atirem o anátema, pois o
anátema é a violação da lei de caridade proclamada pelo Cristo.
60. Com o
egoísmo, os homens estão em luta perpétua; com a caridade, estarão em paz. A
caridade, constituindo a base de suas instituições, pode assim, por si só,
garantir a felicidade deles neste mundo; segundo as palavras do Cristo, só ela
pode também garantir sua felicidade futura, pois encerra implicitamente todas
as virtudes que podem levá-los à perfeição. Com a verdadeira caridade, tal como
a ensinou e praticou o Cristo, não mais o egoísmo, o orgulho, o ódio, a inveja,
a maledicência; não mais o apego desordenado aos bens deste mundo. É por isso
que o Espiritismo cristão tem como máxima: FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO.
Incrédulos!
Podeis rir dos Espíritos, zombar daqueles que creem em suas manifestações;
ride, pois, se ousardes, desta máxima que eles acabaram de professar e que é
sua própria salvaguarda, pois se a caridade desaparecesse da terra, os homens se
entredilacerariam, e talvez vocês fossem as primeiras vítimas. Não está longe o
tempo em que esta máxima, proclamada abertamente em nome dos Espíritos, será
uma garantia de segurança e um título à confiança, naqueles que a trouxerem
gravada
no coração.
Um Espírito
disse: "Zombaram das mesas girantes; não zombarão nunca da filosofia e da
moral que daí decorreram". É que, com efeito, hoje estamos longe, depois
de alguns anos apenas, desses primeiros fenômenos que serviram, por um
instante, de distração para os ociosos e os curiosos. Esta moral, vocês dizem;
está caduca: "Os Espíritos deviam ter espírito bastante para nos dar algo
de novo." (Frase espirituosa de mais de um crítico). Tanto melhor! se ela
está caduca; isso prova que ela é de todos os tempos, e os homens são apenas
mais culpados por não tê-la praticado, pois não há verdadeiras verdades senão
as que são eternas. O Espiritismo vem lembrá-la, não por uma revelação
isolada
feita a um único homem, mas pela voz dos próprios Espíritos que, como uma trombeta
final, vêm proclamar: "Creiam que aqueles que vocês chamam de mortos estão
mais vivos que vocês, pois eles veem o que vocês não veem, e ouvem o que vocês
não ouvem; reconhecei, naqueles que lhes vêm falar, seus parentes, seus amigos,
e todos aqueles que vocês amaram na terra e que acreditavam perdidos
irremediavelmente; infelizes aqueles que creem que tudo acaba com o corpo, pois
serão cruelmente desenganados, infelizes daqueles a que terá faltado caridade,
pois sofrerão o que tiverem feito os outros sofrer! Escutai a voz daqueles que
sofrem e que lhes vêm dizer: "Nós sofremos por não ter reconhecido o poder
de Deus e duvidado de sua misericórdia infinita; sofremos por nosso orgulho,
nosso egoísmo, nossa avareza e por todas as más paixões que não soubemos
reprimir; sofremos por todo o mal que fizemos ao nosso semelhante, pelo
esquecimento da caridade".
Incrédulos!
Dizei se uma doutrina que ensina tais coisas é digna de risos, se ela é boa ou
má!
Vendo-a tão
somente do ponto de vista da ordem social, dizei se os homens que a praticam
seriam felizes ou infelizes; melhores ou piores!
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